sábado, 29 de outubro de 2011

Bom verão!




Desamarre os tênis sem pressa. Desatadas as cordas, não tire-os ainda dos pés. Espiche-se e espreguice-se quantas vezes forem necessárias pra se ouvir todos os músculos, nervos, tendões, cordas, cílios, esfíncteres, epitélios e artelhos se espatifando de prazer... Abra os olhos lentamente (eu duvido que você estivesse fazendo tudo isso aí atrás pros tendões, pros artelhos e pros cílios com os olhos bem arregalados!), e ainda com as mãos entrelaçadas atrás da cabeça comece com as pontas dos pés aquela difícil tarefa de tirar pelo calcanhar o tênis do pé esquerdo e, longos segundos depois, o do direito... Ah!, quase urre. Umas diminutas flatulências clássicas, sem muitas extravagâncias sonoras, são sempre bem aceitas e respeitadas nesses solitários momentos. Ao usar normalmente tênis não estamos de cinto, ou cinta, mas se ele estiver ali, não esqueça: infle com gana a barriga naquela área de aperto e briga eterna entre os dois (cinto(a) e barriga) e, com sutiliza, dê aquela mínima comprimida na “pança” e, dedos ágeis, liberte seus churrascos, sushis, lasanhas, cervejas e vinhos que hibernam um inverno inteiro dentro da gente e que, pra sair, nos cobram caro... Ah!, diga de novo... Aliás, os ahs!: essas interjeições a partir de agora farão parte do vocabulário trivial da manhã à noite. Ah, acordei... Ah, um jornalzinho bem garimpado... Ah, uma musiquinha boa numa hora idem com companhias idem... Ah, não brinca que tem aquele prato preferido no almoço... Ah, então busca meia dúzia de Cicarelli... Ah, vou dormir um pouco, nesse ventinho, no colchão, na grama... Ah, merece um beijo, e muitos e muitos beijos... Ah, papos, caminhadas ao vento, ideias ao vento, contas ao vento, problemas ao vento, dores ao vento... Ah, bota uma música bem alta na “vitrola” e vamos cantar todos, bem alto, que essa nossa vida é muito louca. Quando precisar, amarramos bem forte as cordas dos tênis. Por enquanto... Bom verão!

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Saudades...


Há pouco tempo desapareceu do mapa, escafedeu-se, virou pó, gaseificou, sumiu, explodiu, se desintegrou, tomou doril, viajou, voou, pegou a estrada, deu as costas, pluf! Em segundos, não tínhamos mais o corpo, as tatuagens, os cílios postiços, os porres, os tombos, a voz afinada, o brilho de suas pesadas maquiagens, o visual excentricamente correto, os barracos e rodadas de baiana que só ela sabia dar. Amy Winehouse havia morrido. Ninguém mais ouviria suas loucuras vocais e sociais e marginais e viscerais e espirituais e diabólicas e loucas e mais loucas e cada vez mais loucas apresentações “artísticas”. Que pra mim não tinham nada de artísticas... Era ela purinha, tipo cachaça, sem o golezinho do santo. Ela era o santo... ela era a puta... a risada fora de hora, a calça bem baixa, deixando a calcinha à mostra... os peitos maravilhosos em um ângulo e murchos e sem graça em vários outros. O copo na mão, quase sempre. Os cabelos, um capítulo à parte, eram todos: lindos, horríveis, sebosos, brilhantes, um ninho, um lixo, uma pasta, uma vassoura...
Detesto gente que rotula gentes... Pensando bem, detesto gente que inicia frases com “Detesto...”. Vamos de novo: quem ganha o quê enchendo os pulmões pra chamar outrem de feio, magrão, fofoqueiro, depravado, mulherengo, dadinha? Ninguém! Chega de cinismo, de falsidade, de tapinha nas costas, de rótulos, de pirâmide social, de classes A, B e o caralho... Vamos usar a pleno os pulmões pra dar aquela cafungada profunda na brisa salgada do mar, pra berrar feito adolescente em um show de rock/pagode/sertanejo universitário/sermão da igreja, os dedos ágeis pra fazer cócegas e carícias em quem você quiser e esteja receptivo, os ouvidos pra escutar  um pássaro sem pressa, um choro de nenê sem impaciência e curtir um solo de guitarra “daquela” música que nunca sai da sua cabeça. E o coração... ah, o coração velho de guerra aberto a tudo, a todos, a qualquer empreitada que pintar: acolher um novo amigo, chorar pelo que partiu, apertar por aquela paixão fulminante, encolher e quase sangrar pelos atropelos e desencontros que todo dia são colocados a nossa frente, ou então explodir de alegria com um gol, um emprego, um casamento, um filho...

Sinto saudade da Amy.

sábado, 1 de outubro de 2011

Heavytalizando a lightificação...

Confesso.
Até o último minuto poderia ter heavytalizado a lightificação ao invés de lightificar a heavytalização. Mas algo em mim dizia que o lightificar o heavy tinha mais a ver com o hoje institucionalizado politicamente correto, pra mim sempre o melhor caminho a tomar. Heavytalizar o light, contudo, me fascinava em suas muitas e múltiplas nuanças. Tal qual lightificar o heavy, a outra possibilidade. Tinha que ser um, entretanto. Ao longo de nossos pirados, atordoados, oprimidos, empurrados e enlouquecidos dias e meses e anos damos de cara com ene situações, quase todas com pelo menos duas opções de solução: a certa e a errada, a preta e a branca, a mais curta e a mais longa, a fiel e a infiel, a doce e a salgada, o mar e a serra, a gelatina e a rapadura, a picanha e a salada, a coca e a pepsi, de cara e a mil, e tudo me enlouquecia mais e me entontecia de dúvidas e dúvidas e mais dúvidas e dúvidas.
Quem é heavy? Que situação é light? Tem olhar light e olhar heavy... pegada light e heavy... beijo idem... O ideal, então, seria o meio termo, o consenso, o bom senso, o que eu penso de bom...
Heavytalizemos, pois, a lightificação, quando a situação assim o exigir. Caso contrário, e eles haverão aos montes, lightifiquemos momentos pesadamente heavytalizados.
Sem stress... na boa... na manha...