sábado, 1 de agosto de 2015

Thanks, Spotify...

Sábado, quase trinta graus... O churras na sogra fora show: carne, cerveja, sobremesa, crianças, canal off e os mesmos indispensáveis de sempre. A caminhada ao sol pela Praia de Belas seria o prêmio da mãe natureza ao sincronismo retumbante dos fatos. Porque tudo encaixara: dia, sol, brisa, carro automático, fardinho de Budweiser e vazio esperto do Armelin. Mas só seria. Porque o mundo virtual me faria uma surpresa bem legal ao abrir um aplicativo que uso há horas, escutando várias e várias músicas dos mais variados gêneros, o Spotify... curti desde sempre o software porque ele interpretava momentos pontuais na vida de cada um de nós, desde hora de dormir, acordar legal, tarde acústica, chegando do trabalho, jantar a dois, balada bem pegada, essas coisas. Pois é. Ao abrir a primeira página do programa, pensei: vou ver as sugestões dos caras. E cliquei em Descobrir, que é a palletzinha que leva às dicas do Spotify. E aí de repente, não mais que de repente, ali, na minha frente, nas minhas barbas, a exatos trinta e seis centímetros de distância dos meus olhos... os meus dedos! Isso mesmo. Não eram os seus (de quem estiver lendo neste exato momento esse texto), nem os dedos de ninguém que não eu. Os segundos e minutos posteriores foram de... bah!, meus dedos!, minha foto!, sou eu!, eu existo!, vou processar!, vou ficar rico!, direito de imagem!, é minha!, foda-se!, contribuí!, uhuuuu!, criei uma vibe!, vou embalar uma semana!, até curti a playlist!, pouco a ver comigo!, curtam!, livre arbítrio!, paz e amor!

domingo, 8 de junho de 2014

Muros da infância...

Atordoado. Algo confuso, taciturno, quase macambúzio. Anseio trezentas e vinte e sete coisas que com certeza mudariam para muito melhor os destinos de nós sete bilhões todos, enquanto convivo com a iminente e quase sempre presente incerteza de que quatrocentas e cinquenta e nove coisas estão cabeça a cabeça com as primeiras, ávidas por um final aterrador e cinza e lúgubre e áspero e ácido que nos aguardaria logo ali, no fim da linha de qualquer T5, T2 A ou The End, tanto faz. Violência em luta corporal com o amor. A solidariedade ensanguentada por golpes constantes e contundentes da impunidade, deslealdade, maldade e outras dades do mal que, por piedade, são tantas que faltariam dedos em mãos e pés a enumerá-los... Bem e mal, rico e pobre, preto e branco, homem e mulher, azul e vermelho, Rússia e Estados Unidos, cachorros e/ou gatos, piada de mau gosto ou simplesmente piada, palmada do bem ou palmada do mal, invasão de privacidade ou interagir com outrem, até quando pode?, quem pode?, quem é?, por que é?, pra quê?, com quem?, qual o objetivo?, quanto vale?, quanto pode-se faturar?, fala baixo que ninguém pode saber, sabe com quem tu estás falano? Caralho, tá chato tudo isso. É muro e mais muro pra tudo quanto é lado... Na infância, lembro bem, eles eram primeiramente barreiras, muralhas imensas a serem transpostas. De tijolos, altos, usava-se de artimanhas e planos estrategicamente pensados e treinados. Uma pedra do quarteirão, um pneu, caixas de madeira velhas serviriam. Uma vez lá em cima, o paraíso: era-se grande, gigante, o horizonte dos dois lados era nosso. E naturalmente decidia-se pelo melhor que a ocasião oferecia: jogos de futebol, festas, matadas de aula, um namorico que nem tu imaginava que daria certo só com aquele assobiozinho despretensioso que, há horas, lançava na direção da guria mais bonita da rua... E as coisas aconteciam. Subia-se no muro, decidia-se, fazia-se as coisas e, felizes, descíamos e íamos pras nossas casas jantar e dormir. Hoje, não! Não precisa-se de pneus para sentir-se sobre muros, muros e mais muros. No trânsito, nas escolas, nas delegacias de polícia, nos restaurantes, nas dr's entre maridos e mulheres e namorados e namoradas, nas reuniões de condomínio, nas raves entupidas de gentes e mais gentes de óculos escuros, nos estádios de futebol e nos ginásios de vôlei, futsal, na Voluntários da Pátria, no Marinha, no Parcão, no shopping. A BR 101 é válvula de escape e corda no pescoço; o nepotismo é o ó do borogodó, mas se o primo da tia do meu bruxo conseguir mexer os pauzinhos lá no Tribunal, deu, tô dentro; e com estabilidade. Aceitar a passagem que o motorista está dando ao pedestre é perigosíssimo, pois o que vem atrás pode ser um que caga e anda pra essas frescuras e fazer picadinho do cara. Tirocínio, é disso que precisamos. Estroboscópicos relâmpagos de pensamento pra situações idem, milhares e imensas a todo instante, isso, aquilo, aquele outro, decida rápido, não pense muito, cuidado, perigo! E agora essa porra de Copa da porra da Fifa, pra ajudar nessa Babel de pensamentos. Porra pelo preço, momento e jeito que aterrissou em nosso país. Em tempo: futebol é show de bola. Ensina a vencer e, principalmente, a perder. Lapida o viver em grupo, trabalhar em grupo, ter boas estratégias para solucionar problemas, massageia o ego de cada um ao sorrir e abraçar e pular com seus iguais em dias/noites de duras vitórias... E está instalado, é fato, é realidade, é da vida... Bem como os que não o entendem assim. E o detratam, o condenam, o execram em praça pública. Há espaço pra todos. E os entendo todos. E malditamente me transporto aos topos dos muros de minha infância, só que agora para decisões tremendamente mais importantes e decisivas em minha/nossas vidas. E lá de cima, dos píncaros dos muros de minha infância, gostaria de poder visualizar esta porra de Copa do Mundo com estádios repletos de pessoas que gostam de futebol e, no entorno deles, milhares e milhares e muitos milhares de pessoas que, não tendo o mesmo entusiasmo pelo esporte, ocupassem esses espaços e, também sorrindo, aos gritos, aos berros, socos no ar, com bandeiras e cartazes gigantes, soltassem a voz em busca de melhores condições de saúde, educação, transporte, segurança, habitação. E que ao final dos quarenta e cinco minutos regulamentares dos segundos tempos de cada jogo, esses milhares que estavam dentro do estádio, exercendo e vivendo seu direito intransferível de gostar de algum esporte, de forma animada e solidária também tomassem as ruas, sorridentes, inflando e tornando maior e mais bonito
um movimento/sentimento que, desde sempre, só tem um e vital objetivo: uma vida melhor, mais igual e mais digna a todos nós. Há espaço pra todos, pra tudo, pras diferenças, pros diferentes. E que possamos, todos, descer de nossos muros atuais e dos da infância e, felizes, irmos para nossas casas jantar e dormir.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Black Sabbath no Sarandi...

Escuto até Luan Santana no meu dia a dia, pois é impossível desligar rádios, tvs, os computadores de todo mundo que, eu aceito e respeito, gostam do Luan Santana. Tudo bem... Cada um, cada um. Tem os do pagode, os do funk, os gaudérios da música tradicionalista, o sertanejo, os sambistas, o pop, o tecno, o clássico, o charm, a salsa, a rumba, a lambada (lembram dela?). Pois é, ritmo, embalo, formas de se mexer e de dançar e de cantar e de suar e de render homenagens à música não faltam. São centenas, milhares, eu acho. E curto demais o fato de, vira e mexe, ter um festival de rock aqui, uma pagodeira ali, uma festaneja acolá. Não existe, na minha concepção, momento de maior congraçamento e integração entre seres humanos do que num encontro musical: todos ficam iguais, e isso é muito bom. Voltando aos tipos de música: tem gente pra consumir tudo isso. E idolatrar artistas, santificar vocalistas, colocar nos céus cantoras e cantores que, seja por que motivo for, fazem as suas cabeças, seus corpos, suas mentes. Respeito, pois, todos os gostos, ritmos, artistas que, a seu modo, fazem esse bem impagável e inigualável que é proporcionar minutos ou algumas horas de êxtase coletivo, independente do suingue em questão... Viva a música!
Só que dentro desse mundo música, dentro desse imenso e heterogêneo setlist de cantores, cantoras, bandas, ritmos e tudo mais, cada ser humano, cada um de nós, vai guardando em seu hard disk mental aquelas e aqueles que mais se encaixam, fecham, unem, batem, brilham, mexem, cutucam, arrepiam, fazem chorar, rir às pencas, fechar os olhos, viajar...
Eu, agora. Ouço de tudo. Sou eclético. Não tenho preconceitos com nenhum gênero musical, apesar de gostar quase nada de alguns poucos, muito pouco de outros e praticamente não ouvir uma quantidade considerável de... de... ritmos musicais, vamos deixar assim. Não gosto, porém os respeito e os aceito. Lembra lá de cima: cada um, cada um!
Tenho os meus gostos. E, como você e os seus, certamente, os considero os melhores. E dentre eles não vejo, ouço, sinto nada mais legal que um rasgado solo de guitarra dentro de um ensurdecedor e bem calibrado rock'n roll. Talvez minha tendência de gosto seja maior pro rock progressivo da antiga, mas o termo rock'n roll, mais abrangente, genérico, geral, se encaixa melhor.
Lá atrás, “há poucos anos”, escutava Beatles, Rolling Stones, Sex Pistols, Led Zeppelin, Gênesis, Yes, The Who, Alice Cooper, Deep Purple, U2, Creedence Clearwater Revival, Kiss, Metallica, Iron Maiden, Uriah Heep, Pink Floyd (aspas pra ele: “a banda”, entre todas as outras, na minha humilde opinião), e aprendi a gostar com o passar dos anos de bandas mais atuais, como Coldplay, Red Hot, Alice in Chains, Foo Fighters, Linkin Park... enfim, faltaria espaço pra enumerar tanta gente boa que tá mandando bem nos dias de hoje.
Só que na listinha dos “dinossauros” aí de cima, você deve ter sentido a falta de alguém, né? Pois não é que esse dinossauro que falta ali na linha dos meus favoritos estava ontem, numa linda noite de primavera, com sua formação praticamente original e histórica, a poucos metros da freeway, cara! Na Assis Brasil, aqui em Porto. No estacionamento da Fiergs... no Sarandi! Isso mesmo. Black Sabbath, a lenda maior do heavy metal mundial, tocou ontem no Saranda. Com Ozzy Osbourne cada vez mais louco e jovem nos vocais. Os guitarristas da antiga e seus rifs alucinantes e um batera monstro, que abriu nossas cabeças a baquetaços escavadores (uma ressonância magnética jamais conseguiria resultados melhores...).
O Black Sabbath me acompanhou durante o começo e toda adolescência, a juventude inteira, pela vida adulta e, “se Deus quiser”, terá participação especial na trilha sonora do meu “electric funeral”...
Thanks, Black Sabbath.

domingo, 28 de abril de 2013

Não lembro ao certo...



Dias atrás, vários dias atrás até, não lembro ao certo, postei na internet, através do app Facebook (uma dica pra quem não conhece ainda: entre em www.facebook.com.br, tudo minúsculo), a imagem de um magnífico pôr do sol aqui na cidade em que moro, moro e vivo há horas, várias horas até, não lembro ao certo. Era hipersuperultramegamaxi colorido, apesar de ser só laranja e cinza, eu acho... Tinha verde escuro e marrom, tudo bem, mas em menos destaque no todo da foto. E eu até preço dei pra tal momento, praquele momento luminosamente único e paradoxalmente múltiplo, eterno em seu passado inesquecível e explodindo em todo seu encantamento de presente, de agora, de se dar aquela suspirada funda, encher do oxigênio menos contaminado que a vida nossa de cada dia vai nos presentear e então, agradecidos, cultuá-lo como “o” momento. Que serão todos, dia a dia. Recomeçar, agir, trabalhar, descansar, ir pra melhor balada, pescar, reivindicar, fazer uma indiada, tomar um banho de mar ou de chuva, namorar, sorrir, rever e cultivar os amigos da antiga, aprender com os do presente e, claro, enchendo seu apê intelectual de novos amigos, novos objetivos, novas ideias e ideais, essas coisas todas que amigo que é amigo mesmo sabe do que é que eu estou falando... Pois bem, como eu dizia, postei uma imagem e um preço que eu achava que valia “a minha” visão de tudo aquilo. Trilhões, quadrilhões de euros, dólares ou reais, não lembro ao certo... Pois é. E aguardei de calculadora na mão pra fazer as contas dos acessos, curtidas, tripas de comentários e, aham!, muitos compartilhamentos. O post foi literalmente ignorado pelo mundo moderno. Na mídia impressa, escrita, televisionada, ouvida, digital e até a mais nova, em 3D, nenhum pixel. Um ou dois curtiram, e um deles inclusive fez um comentário que, até os dias de hoje, patino pra entender se entendi ou não: “aham!”. Desde então, prefiro não perder mais meu tempo nem me estressar com isso... Eu tenho mais é que curti-lo (o meu tempo).
Até porque, daqui a pouco tem outro amanhecer, outro anoitecer, milhares e milhares de pores do sol pra eu e os dois parceiros que curtiram (um comentou!) o meu post facebookiano de vários e vários dias atrás, não lembro ao certo. E o resto do mundo também... se quiserem, claro.
O dito pôr do sol é o grande no fundo do blog, perto de outros pores e nasceres. Já aumentei em 0,68% o valor da imagem que falei lá em cima, de quadrilhões de euros, dólares ou reais, não lembro ao certo... Tô sem calculadora agora, mas aberto a negociações. E aceito carro no negócio, claro. Então, saciem seus olhos. Bom dia... e boa noite!
Aham!

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Sentimentos antagônicos...



As flores nascem às pencas, dia a dia, sol a sol
Ignorando as lanças pontiagudas das cercas enclausuradoras
Belas, perfumadas, de matizes cmyk, rgb e até pantones
Enquanto pensamentos e palavras ferem, fétidos e fúteis
É gol! Grito... burburinho... ceva... bandeiras tremulando
Morreu! Capela tal... café preto... era uma boa pessoa...
Amemos enquanto forças tivermos
Nossas dobradiças enferrujarão inexoravelmente
Ao som de rock, funk, pagode... ou sem fundo musical
Silêncio que pode ser transporte ou sepulcro, sabe-se lá
Azul ou vermelho? Vista-se dos dois, e verde... amarelo... roxo!
Não critique... ajude. Não duvide... acredite. Não desista... faça.
Ame... ou não. Viaje... ou não. Tenha filhos... ou não.
Abra-se ao inusitado, à surpresa... Inove. Multiplique-se.
Banhe-se de chuva, de mel, de chantilly, de saliva...
Sorria de tudo, pra todos, em todo lugar, sozinho. É fácil.
E chore pipas pelo amigo, pelo time, pelo amor volátil.
Não tenha medo e cuide-se!
Feche os olhos mas, lembre-se, mantenha-os sempre abertos.
Amanhã é outro dia... e pode fazer um sol maravilhoso.
Ou chuvas, raios e trovões.
Escolha.

Afinal, as flores nascem às pencas, dia a dia...

sábado, 1 de dezembro de 2012

Voa, passarinho...


Sábado de tarde. O leve mal-estar ainda persistia. Na noite anterior, na despedida de uma colega de empresa, a cerveja gelada foi sorvida por todos com goles os mais antagônicos: alegres, despreocupados, pensativos, saudosos, irreverentes, reverentes... e a cerveja sendo sorvida bem gelada. Não deu outra: aquela dorzinha de cabeça chata, que só pareceu aumentar depois que um toró caiu sobre Porto Alegre no finalzinho da manhã. Mas naquelas: caiu, molhou tudo, secou e levantou um bafão dos mais quentes. Só deitando depois do almoço. O joguinho de futsal do Falcão (ele perdeu!) nem me chamava muito a atenção, por isso mesmo mexia no celular, vendo algumas fotos recentes... Quando aconteceu! Foi tudo muito rápido. Um passarinho minúsculo, que alguns chamam de “sebinho”, espécie que tem uma pequena e quase imperceptível coloração amarela no peito, ou na cabeça (não lembro bem), deu um rasante cinematográfico com pirueta e duplo twist carpado sobre a minha cama. No retorno em direção à janela, creio ter ouvido o roçar de suas asas na porta amarela do armário, tudo em segundos... A minha janela é velha, está estragada, então colocamos uma pedra de granito pra segurar a parte inferior aberta e a de cima fechada. Pois não é que o passarinho resolveu voltar à liberdade pela parte de cima, deu de cara no vidro, bateu as asas meio desnorteado e foi escorregando pra baixo, justamente na parte em que as duas janelas se encontravam. E ali ficou. Preso. De cara. Estressado. Se debatendo, se machucando, apavorado entre os dois vidros. Já tinha pulado da cama, feito a foto em segundos e pensava como tirar o sebinho dali sem machucar mais o cara. E tudo isso muito rápido, meio trash, meio fim do mundo, meio “bah, quê que eu faço, meu Deus!”... Duas tentativas frustradas de separar as janelas me levaram ao plano B, que fiz rápido. Subi numa cadeira e, segurando e empurrando bem a parte de cima com a mão direita, com a esquerda puxava o que dava a outra lâmina. Duas, três, na quarta o passarinho passou entre o vão e, como pássaro que é, saiu batendo asas...
Na boa, não me interessa nem um pouco o resultado do jogo do Grêmio amanhã. O sentimento nessa hora é sobre ter coisas, ter pessoas, ter posses, ter amigos, parentes e paraísos que são só nossos. Cada qual tem os seus, e os trocamos, e compartilhamos, e misturamos os nossos com os dos outros e tudo vira essa geleia geral chamada vida. E eu gosto disso. De psiquiatrizar tudo isso. Só que durante esse emaranhado de trocas, compartilhamentos e misturas, pagamos o caríssimo pedágio das perdas, das despedidas, dos tchaus que muitas vezes serão os últimos mesmo. E isso é foda!
Não tenho como não pensar em saudade, em tristeza, em final, depois de perdas profundas e incicatrizáveis de pessoas insubstituíveis nos últimos meses. E o Olímpico e o meu Grêmio ainda vêm colocar toneladas e mais toneladas de concreto e ferro sobre essa cabecinha um tanto quanto sofrida por perdas, despedidas, finais, viagens sem volta... Na foto, lá atrás, quase aparece a minha casa. Eu sentia, até mesmo dali, a respiração do estádio. Isso durante anos, anos e anos.
Mas não. Dor é inevitável, sofrimento é opcional. Esse passarinho veio me avisar que o novo está ali na esquina. É só nos focarmos nisso. Talvez no próximo dia de trabalho, no jogo do teu time do coração, naquela viagem tão sonhada, o beijo finalmente dado. O curso. O mestrado. O sitiozinho na beira de uma lagoa. Um filho. Um filme... Faça a sua lista, e vá à luta.  Ah, voltando ao passarinho: ele, o desastrado piloto sebinho, poderia ter morrido ali prensado entre dois vidros se não houvesse alguém que o ajudasse. E coube a mim a feição, a mão, a lição. Valeu, sebinho. Valeu, passarinho. Voa, passarinho!

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Rock in night


Sexta-feira 13. De julho. Dia mundial do rock. Noite, agora, já passava das sete da noite. E bares, gentes, carros, luzes as mais variadas e coloridas, gordas, com música ao vivo, possantes, barulhentos, sedentos, estroboscopicamente entrando e saindo de mesas, balcões, pubs, mercados, farmácias, pets... Downtown fervilha. Em cadeiras verdes de plástico pedimos cervejas, caipiras, whiskys, vodkas e tequilas, porque ninguém é de ferro. En passant, lambuzamo-nos com oleosos e amarelados retângulos de polenta por sobre iscas de calabresa, ovos de codorna, queijos quadrados imensos e, pra depressão geral da mesa, corações e corações de galinhazinhas que, há tempos, foram aqueles pintinhos amarelinhos, feito bolinhas de tênis emplumadas, fazendo piu, piu... piu, piu. Mas, azar deles. Pedimos outra ceva e mudamos rapidamente de assunto. E imediatamente lembramos dos Anárquicos e Calculados, que em minutos estariam à nossa frente ali na João Alfredo com a Travessa do Carmo. Showzaço. Borges e Pâmela, meus parceiros de noite, fizeram suas breves explanações cultural-musicais sobre a banda, suas músicas preferidas, performances anteriores e, já de pé, tomamos o rumo do barulho, que já se ouvia a duas quadras dali. Ao entrar na João Alfredo, os acordes das guitarras nos fizeram levitar e, assim, flutuamos diante e sobre milhares e milhares de cabeças loucas, feitas, de nego, dinossauro, ocas, duras... todas. E estacionamos a metros do trio elétrico onde Samuel Meneghetti já mandava ver sua terceira, quarta música bem embalada. E a batera mandando ver atrás, com solos que convidavam a goles e mais goles de cervejas cada vez mais geladas... e a gente tomando, e dançando, pulando... até começar aquela música, aquele momento, aquilo que mudaria o rumo de todo aquele dia-noite mundial do rock. Assim que os primeiros acordes de “O Nome Dessa Rua” ecoaram pelos saguões e corredores e escadarias dos edifícios da Cidade Baixa, minha mente, meus olhos, meus ouvidos, meus cento e dezessete sentidos se ouriçaram e brilhou uma ideia que, porra, vão se fuder, alguém ia ter que ter lá em cima do trio naquela hora... Claro, caralho! Era dia do rock, a rua estava lotada, todo mundo trilili, o som alto pra cacete e, no refrão, Samuel gritaria aos quatro quantos da nossa mui leal e valerosa Porto Alegre que... pãrãrã... “Na Rua da Conquista...aaaa, Travessa Paraísooooooo”. Pô, é lógico que o Samuel Meneghetti vai sacar e trocar, de prima, ou na segunda vez que entoar o refrão, por “Na Rua João Alfredooooooooo,  co’a Travessa do Carmoooooo....”. Meu Deus! Paralíticos andariam. Senhoras emboloradas e cinzentas jogariam seus rolos de cabelo no asfalto, aos gritos, enquanto grupos de lindas e reluzentes garotinhas balouçariam seus peitos nus das sacadas trepidantes das redondezas, além dos casais que, em pleno leito da rua, beijariam-se apaixonados e ensandecidos a comemorar aquele momento mágico que só o bom e velho rock’n roll nos proporciona pela vida afora. Mas, e por toda a nossa vida afora sempre haverão “mas”, mas ninguém teve aquela “minha” ideia. E veio a terceira vez o refrão, e a quarta, e nada. E Borges e Pâmela já haviam feito um sinal concordando com a minha sacada, mas nada acontecia. Até ali. Até aquele instante. Não sei nem como, mas ao tentar correr em direção ao trio, com a lata de cerveja na mão, tropecei feio em algum objeto no chão e, cambaleante, dei encontrões em gente que dançava ali na frente, chegando a encharcar de ceva os peitos voluptuosos e acolchoadamente macios de uma loira que deu o azar de estar bem ali, naquela hora, naquele lugar, na noite mundial do rock. Os passos seguintes foram trôpegos e perigosos, pois as banquinhas de bebidas, algodão doce e churros emparelhavam-se feito colunas militares a avançar sobre mim, por mais que delas tentasse me desvencilhar. Sentia que a música estava terminando... precisava avisá-los antes que fosse tarde demais. Nem notei, pelo frenesi de sons/gritos/luzes/álcool, quando os amigos da loira voluptuosa abriram uma clareira entre as gentes, indignados, bestializados, endemoniados, capetalizados, endiabrados, e com álcool nas mentes, encostaram bufando atrás de mim. Não vi isso. Porque pulava naquele momento escandalosamente em frente ao trio elétrico berrando “na Rua João Alfredoooo”, Samuel!!! “Co’a Travessa Paraísooooo...”. Estão me ouvindo? Ei!!! Aqui!! E ao dizer aqui, agarrado ao trio, caí sobre a pilha de caixas de cerveja e refri, espalhando meu sangue, cacos de vidro e mais barulho ainda naquela hora. Com o rosto no asfalto, vi que Borges e Pâmela já se engalfinhavam com amigos dos amigos da gordinha peituda. Os donos de carrocinhas que tentaram se aproveitar das garrafas que não quebraram foram imediatamente atacados pelo pessoal das bebidas, que usavam essas para defesa e ataque. Ouviu-se sirenes, pneus cantando, gritos e, dizem alguns, até tiros foram disparados. O saldo só se saberia no Diário Gaúcho do dia seguinte, brincou Borges com sua mochila em farrapos às costas, abraçado a uma sorridente e sempre bela Pâmela, mesmo depois de vários chutes e croques nas paletas. A franja, pelo menos, estava impecável. Depois dos pontos e suturas triviais no HPS, despedimo-nos exaustos e felizes. Saranda pra um, altos da Protásio pra outra. E eu, trêbado ainda, botei o fonezinho no ouvido, aumentei o som e... zum. Tomei meu rumo, pensando na noite mundial do rock, nos meus parceiros de festa, nos loucos acordes de uma guitarra e, claro, nos belos e fartos e voluptuosos e molhados e macios peitos da loira que, vocês devem lembrar, eu falei algumas linhas atrás.